Argentina diz que não reconhece os US$ 10 bi cobrados pela Repsol por expropriação
Um dia após ter anunciado a expropriação da Repsol-YPF e provocado uma crise com a Espanha, o "governo K", da presidente argentina, Cristina Kirchner, deixou claro que não pagará uma indenização de 8 bilhões (cerca de US$ 10 bilhões), como quer a empresa. O encarregado de anunciar a posição da Casa Rosada na queda de braço que chegará a tribunais internacionais foi o vice-ministro da Economia, Axel Kicillof, autor do projeto de lei que começou a ser debatido ontem no Congresso . Em quase três horas, o jovem economista defendeu a ação do governo argentino e assegurou que a criação de uma nova YPF foi necessária já que "os objetivos da Repsol não estavam em sintonia com os objetivos do país".
Dirigentes da oposição lembraram ontem que a própria presidente votou a favor da privatização da YPF na década de 90, quando era deputada. Os funcionários de seu governo argumentaram que "os tempos mudaram e hoje as necessidades do país são outras".
- Vamos pagar o custo real, não os US$ 10 bilhões que diz (Antonio) Brufau (diretor-executivo da Repsol). Onde diz isso? - questionou Kicillof, que acusou a Repsol de ter usado os recursos obtidos na Argentina para ampliar negócios em outros países, prejudicando a produção nacional de petróleo, e obrigado o governo a desembolsar quase US$ 10 bilhões para importar combustíveis no ano passado. - Nosso crescimento não pode estar ameaçado por empresas estrangeiras que têm lógicas diferentes.
Rajoy: medida afeta todo o continente
O objetivo do governo argentino é que, na próxima semana, seja aprovado no Senado o projeto que declara de interesse público a produção, exploração, comercialização e distribuição de petróleo. A votação na Câmara ficaria para maio. Ontem, Kicillof, acompanhado pelo ministro do Planejamento, Julio De Vido, lembrou que o valor da indenização à companhia espanhola, após a transformação do projeto em lei, será determinado pelo Tribunal de Avaliação do Estado argentino.
Longe de se preocupar com a reação internacional e possíveis retaliações por parte da Espanha e de outros países da União Europeia (UE), o governo argentino transmitiu por Kicillof uma mensagem às empresas que operam no país, nacionais e estrangeiras:
- Não podemos ter empresas cujos interesses colidam com os do país.
No México, onde participa do Fórum Econômico Global, o presidente de Governo da Espanha, Mariano Rajoy, afirmou que a expropriação prejudica todo o continente. E disse que não há justificativa para a medida, que abre "um grave precedente".
Segundo o governo Kirchner, já surgiram propostas de parceria com a nova YPF e, dizem fontes, essas propostas partiram de empresas de Noruega, EUA, China e Canadá. Na visão de economistas, como o diretor de Pesquisa do FMI, Thomas Helbling, a guerra entre Argentina e Repsol terá impacto negativo para o país, que vem recebendo menos investimentos estrangeiros diretos que Brasil, Chile, Peru e Colômbia. Segundo a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), no primeiro semestre de 2011, os investimentos captados pela Argentina alcançaram US$ 2,4 bilhões, uma queda de 30% ante igual período de 2010. Já o Brasil recebeu US$ 44 bilhões, Chile, US$ 7,9 bilhões, Colômbia, US$ 3,6 bilhões e Peru, US$ 3,5 bilhões.
Ontem, Brufau, o diretor-executivo da Repsol, afirmou que usará todas as vias legais contra a Argentina. Segundo ele, em primeiro lugar, a empresa recorrerá ao Tribunal de Disputas do Banco Mundial, para reivindicar 8 bilhões (US$ 10 bilhões), por sua participação acionária de 57,4% na YPF, cujo valor total estaria em torno a 14 bilhões. Brufau deixou claro que este será apenas o primeiro passo de uma batalha judicial em várias frentes, com ações constitucionais, administrativas, mercantis e de responsabilidade civil por danos e prejuízos.
- Pediremos esta quantia e muito mais. Esta atitude não ficará impune - disse Brufau. - Eles se ampararam numa lei do ditador (Jorge) Videla. Foi patético e vergonhoso.
Segundo Fernando Zilveti, advogado especialista em direito internacional e professor da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, a indenização deve ser definida em um tribunal internacional:
- Expropriação não é ilegal, mas tem de ser indenizada.
A Comissão Europeia adiou a reunião do comitê UE-Argentina, prevista para amanhã em Buenos Aires. As ações da YPF continuaram suspensas na Bolsa de Nova York e, em Buenos Aires, despencaram 7,5%. Os papéis da Repsol caíram 1,69% em Madri.
(*) Colaboraram Flávia Barbosa e Roberta Scrivano, com agências internacionais
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