sexta-feira, 13 de abril de 2012

Quem vai presidir o Banco Mundial

Fonte: Valor Econômico
Autor: Rogério Studart
No momento em que o Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (Bird) escolhe um novo presidente para substituir Robert Zoellick, pode-se dizer que ele se encontra numa encruzilhada em sua história. O papel de uma eleição é debater ideias, reunir apoio político em torno de plataformas específicas e escolher a melhor liderança. A eleição atual do presidente dessa instituição pode ser um primeiro passo importante para um debate sincero entre os acionistas para a construção do Banco Mundial do século XXI - e, talvez, do que queremos para o futuro da comunidade internacional e do sistema multilateral.

O Bird foi fundado em 1944, em meio à II Guerra Mundial e a uma recessão global econômica grave. Sua criação reflete a atitude prevalecente de que a melhor maneira de evitar a repetição da história seria promover uma reconstrução rápida e buscar o desenvolvimento equilibrado de todas as nações. Com a recuperação das grandes economias industrializadas, no entanto, essa percepção inicial desapareceu. O apoio ao desenvolvimento de todas as nações começou a ser visto menos como interesse comum e mais como uma questão de caridade por parte dos doadores.

A crise de 2008 foi uma trágica lembrança da nossa necessidade de termos instituições multilaterais verdadeiramente globais. Em um mundo cada vez mais integrado, interligado e interdependente, a crise, que teve origem em uma pequena parte do sistema financeiro dos Estados Unidos, espalhou-se rapidamente para tornar-se um desastre financeiro mundial. Seus impactos foram fortemente sentidos no comércio internacional e na produção em países grandes e, finalmente, ela se converteu em uma crise de emprego e transformou-se em uma grande fonte de instabilidade política.

O Grupo Banco Mundial desempenhou um papel na resposta à crise financeira, aumentando os seus empréstimos, mediante um apoio adicional para setores privados, e pela canalização de financiamento para países de baixa renda.


O papel do banco, no entanto, foi severamente limitado pelo seu tamanho, pelo seu modelo de negócio como uma instituição "doador-beneficiário" e oprimido pelas condicionalidades pesadas e rigidez operacional. Agora, a situação agrava-se: a capacidade financeira do Banco Mundial para seguir respondendo está enfraquecida no momento em que ainda estamos longe de superar a atual crise e suas consequências.

Essa situação reflete um apoio político titubeante demonstrado pela lenta implementação das reformas de governança fundamentais, das reformas operacionais e pela falta de apoio a uma reposição de capital. Alguns justificam esse desdém com o argumento de que qualquer aumento adicional de capital seria um mau uso de dinheiro dos contribuintes. Além disso, alegam que dado que alguns clientes tornaram-se grandes economias com acesso aos mercados de capitais, o Banco Mundial seria menos necessário. Esta visão está errada por pelo menos duas razões.

Primeiro, ao contrário da percepção convencional, a dependência do Grupo Banco Mundial de recursos dos contribuintes tem sido exagerada. O Grupo é uma cooperativa composta por quatro instituições financeiras - o Bird, a Associação Internacional de Desenvolvimento (AID), a Corporação Financeira Internacional (CFI) e a Agência Multilateral de Garantia de Investimentos (Miga) e do Centro Internacional para Arbitragem de Disputas sobre Investimentos (Ciadi). O Bird e a CFI utilizam-se do seu "status" AAA para obter taxas de mercado preferenciais e emprestar, respectivamente, aos governos de países em desenvolvimento de renda média e a projetos privados com impactos de desenvolvimento significativos. Como uma cooperativa financeira, o grupo tem sido um sucesso. Tanto o Bird quanto a CFI têm sido historicamente tão rentáveis que sua recapitalização inteira após a crise asiática em 1998 ocorreu sem nenhuma injeção adicional de capital dos acionistas, e parte de seu lucro líquido foi utilizado para recapitalizar outra parte do grupo, a AID.

Em segundo lugar, se os custos do Banco Mundial para os contribuintes são relativamente pequenos, os seus benefícios são enormes. O grupo não é simplesmente um provedor de financiamento barato e doações; tampouco é apenas um "banco".

O Bird se transformou em uma plataforma importante para promover o diálogo e a cooperação entre as nações, para reunir e compartilhar experiências na formulação de políticas, para promover o desenvolvimento do setor privado e para debater soluções para lidar com desafios enfrentados por quase todos os seus membros. Representantes do banco discutem como combater a mudança do clima e mitigar seus impactos, como superar a insegurança alimentar, como criar empregos e expandir redes de seguridade social de forma sustentada, como promover a inclusão social e econômica e como promover a igualdade de gênero.

Em um momento em que países em desenvolvimento e desenvolvidos precisam reinventar nossos caminhos de desenvolvimento, quando as autoridades enfrentam desafios extraordinários e recursos escassos, certamente uma plataforma como esta pode ser um instrumento fundamental a serviço de todos. Mas esse potencial só pode ser cumprido se conseguirmos reunir o apoio de todos os membros. As estratégias e políticas do banco devem ser fruto de um processo de construção de consenso que deve pertencer a todos os membros. Isso exige mudanças na governança do Banco Mundial e no seu modelo de negócios.

Atualmente, o banco ainda é percebido como uma instituição "dominada" pelos doadores, na qual a voz dos países em desenvolvimento e sua influência são incompatíveis com seu tamanho relativo e responsabilidade na abordagem dos grandes desafios. Como já falamos, esta eleição é uma oportunidade extraordinária. Se conseguirmos abraçá-la, os vencedores deste processo de seleção de um novo líder seremos todos nós e nossas futuras gerações.

Rogério Studart é diretor-executivo do Brasil no Banco Mundial

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