A reunião da Cúpula das Américas constituiu uma oportunidade para o Brasil, lá representado pela presidente Dilma Rousseff, mostrar-se em seu novo papel na geopolítica latino-americana, agora em posição de proeminência, que o governo dos Estados Unidos, por gestos e palavras - do presidente Barack Obama, também presente em Cartagena, e da secretária de Estado, Hillary Clinton, que visitou Brasília dias depois -, reconhece como fato irreversível
No fórum de 590 dirigentes de empresas que ocorreu de forma paralela ao encontro de chefes de Estado da Cúpula das Américas, em Cartagena, o papel que o Brasil desempenhou ficou claro: a presidente Dilma Rousseff dividiu o cenário do principal painel com o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama. Sentado entre ambos, como se fosse um elo entre dois polos, estava o presidente anfitrião, o colombiano Juan Manuel Santos. Era a manhã do sábado, 14 de abril. Santos anunciaria na tarde do dia seguinte a entrada em vigor do Tratado de Livre Comércio (TLC) com os Estados Unidos.
A imagem ilustra a polaridade que se estabeleceu no continente a partir do início do século XXI. Entre o Peru e o México, com as exceções de Venezuela, Equador, Cuba e Nicarágua, os EUA ainda são a grande referência econômica. Quase todos os países nesta faixa estabeleceram tratados de livre comércio com os EUA. Santos, como anfitrião da Cúpula das Américas, esteve à frente desse bloco. O cone sul do continente e a Venezuela convergiram para o Mercosul, em que o discurso predominante é o de Dilma.
Talvez seja uma coincidência da diplomacia, mas a Cúpula ficou espremida entre duas visitas de Estado entre Brasil e EUA, cujos contatos estão mais frequentes do que nunca em tempos sem crise. Antes do encontro na Colômbia, Dilma Rousseff visitou Barack Obama em Washington. Em seguida à cúpula, Hillary Clinton tomou um avião para Brasília, onde declarou que "é difícil imaginar um Conselho de Segurança da ONU [Organização das Nações Unidas] reformado sem a presença de um país como o Brasil". A declaração é um passo discreto na direção do apoio ao pleito brasileiro por um assento permanente no conselho.
O papel central exercido pelo Brasil nas reuniões de Cartagena está ancorado na sua participação crescente, e muitas vezes central, na economia dos vizinhos. "Hoje, quem está exposto a riscos na América Latina não são mais os EUA, mas o Brasil", diz Matias Spektor, coordenador do Centro de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas. Portanto, "os investimentos fornecem instrumentos importantes para influenciar os caminhos da região, principalmente através dessa relação de dependência recíproca com os vizinhos".
Essa exposição é fruto dos investimentos importantes que o governo e as empresas brasileiras mantêm em outros países da região.
A política do país está ancorada em um regime definido como "solidário" pelo Itamaraty, ou seja, orientado para se inserir nas economias vizinhas de acordo com suas necessidades: tecnologia de pesca para países caribenhos, mediação com as Farc (Forças Armadas Revolucionárias) na Colômbia, fornecimento de petróleo com segurança para o Chile.
Empresas de peso, públicas e privadas, têm presença forte no continente, como Vale e Petrobras. Também avançam companhias do setor financeiro - agências do banco Itaú estão espalhadas por Buenos Aires e Santiago do Chile -, e empreiteiras, como a Odebrecht, responsável pela modernização do porto de Mariel, em Cuba, e a OAS, que constrói uma estrada na Bolívia como parte do projeto de abrir uma conexão viária para o Oceano Pacífico.
A magnitude da presença brasileira no continente é descrita por Kellie Meiman, diretora-executiva na consultoria McLarty Associates, que foi diplomata no Brasil e em outros países do continente: "Ao visitar os países da América do Sul e Central, ouvia constantemente falar nas "big americans", empresas americanas que dominavam a economia desses países. Agora, esse discurso teve de abrir espaço para um novo ator, as "grandes empresas brasileiras".
O peso dos investimentos nos países vizinhos produz uma interdependência que, por sua vez, é um primeiro passo para a integração regional, ao torná-la necessária. A Petrobras é responsável por quase um quarto da arrecadação de impostos bolivianos, enquanto a energia que alimenta as indústrias do Sudeste brasileiro vem, em grande parte, da usina binacional de Itaipu, na divisa com o Paraguai. Uma crise em algum desses países, política ou econômica, poderia trazer riscos para a economia brasileira.
Nem sempre a interdependência é recebida com sorrisos pelos vizinhos. A construção de uma estrada em terras indígenas na Bolívia, com financiamento do BNDES, foi suspensa no ano passado pelo presidente do país, Evo Morales, acusado pela imprensa de ser um "títere do imperialismo brasileiro". Os protestos indígenas tiveram um impacto particularmente forte no país, porque Morales foi eleito como um representante da população indígena.
Também na Bolívia, as relações com a Petrobras são dúbias. Em 2006, o governo de Morales anunciou a nacionalização do gás boliviano e tropas do país chegaram a ocupar uma refinaria da Petrobras. No ano seguinte, duas refinarias foram compradas pela Bolívia, ainda no esforço de nacionalização. Foram momentos de crise, mas, como assinala o embaixador Antonio Simões, subsecretário-geral da América do Sul do Ministério das Relações Exteriores, não se chegou ao extremo de cortar o fornecimento de gás para o Brasil.
"Não teria sido do interesse deles interromper o fornecimento, vender para o Brasil é importante", diz o embaixador, usando o caso boliviano como exemplo para as vantagens de estreitar as relações com os vizinhos sem passar a impressão de se tratar de um comportamento de tipo imperialista. O temor boliviano, hoje, foi, desde a independência, expresso também por outros países, a começar pela Argentina.
A atuação diplomática do Brasil é considerada "muito sofisticada" por Riordan Roett, cientista político especializado em América Latina, professor da universidade Johns Hopkins e autor de "The New Brazil". A crise com a Bolívia foi resolvida com uma conversa entre Lula e Evo Morales em Brasília. Quando houve um desentendimento com Fernando Lugo, presidente do Paraguai, por causa da divisão da energia da usina de Itaipu, em 2009, a solução foi encontrada pelo mesmo método. "A maior preocupação dessa diplomacia é evitar ou minimizar danos", diz Roett.
Durante o governo de George W. Bush nos EUA, encerrado em 2009, a orientação da política externa americana foi de delegar ao Brasil a execução, ou ao menos a defesa, de algumas de suas bandeiras, particularmente a oposição às políticas bolivarianas de Hugo Chávez e o combate agressivo, militarizado, ao narcotráfico. "Condoleezza Rice [então secretária de Estado] veio ao Brasil para exigir que o Brasil "fizesse alguma coisa" contra a Venezuela", diz Roett. "Brasília, já no governo Lula, foi muito sábia ao não seguir o que Washington preconizava."
""Delegar" é uma curiosa escolha de palavras", afirma Julia Sweig, do "think tank" americano Council on Foreign Relations. "Na verdade, não consigo imaginar alguém em Brasília usando essa palavra para descrever as políticas que Washington tentava empurrar para cima do Brasil."
Ainda durante a gestão de Bush, ficou evidente que o Brasil não pretendia ocupar o espaço que Washington lhe oferecia de maneira tão categórica. Hoje, resta aos EUA reconhecer que o Brasil, em particular, e a América Latina, em geral, "já deixaram há muito tempo de ser seu quintal", como frisa Spektor.
"Em Washington, o governo já se deu conta de que o Brasil está em outro patamar, tornou-se uma peça importante no jogo global", diz David Rothkopf, presidente da consultoria internacional Garden Rothkopf. "Mas ainda não está agindo plenamente de acordo com isso."
Os sinais, segundo Rothkopf, são contraditórios. Por um lado, o Departamento de Estado, comandado por Hillary Clinton, designou Thomas Shannon para a embaixada em Brasília. Trata-se de um dos mais prestigiados diplomatas de seu país e um nome muito próximo a Hillary. Antes de assumir o cargo no Brasil, foi secretário-assistente para assuntos do Hemisfério Ocidental. Por outro lado, o tratamento oferecido ao Brasil continua inferior a seu prestígio e, principalmente, à atenção dispensada a outros países de importância semelhante, como a Índia e a China. Rothkopf ilustra essa discrepância citando o caso do acordo nuclear com o Irã, costurado por Brasil e Turquia em 2010. "Enquanto o Brasil foi criticado e punido, nenhuma palavra foi dita em relação à Turquia. A relação dos EUA com aquele país nunca esteve melhor", comenta.
Dentre os temas que opõem as duas maiores forças do continente, aquele que mais reverbera nos demais países é o do "tsunami monetário", como diz a presidente Dilma Rousseff. "Temos que tomar medidas para nos defender, e não nos proteger. É importante diferenciar defesa de protecionismo. Não podemos deixar nosso setor industrial ser canibalizado", disse Dilma aos empresários.
O excesso de liquidez atinge os países do continente de maneira desigual. O real tem o câmbio mais valorizado porque sua economia é a maior do continente. Como consequência, afirma Roett, Dilma tem o discurso mais vigoroso em defesa de políticas compensatórias e de proteção à indústria. Os demais países podem interpretar esse discurso como recusa à abertura do mercado, não só para os produtos industriais chineses, mas também aos capitais financeiros abundantes.
Roett não vê essas medidas como tendência para o longo prazo. As iniciativas de integração regional são mais fortes, a começar pela rodovia que liga o Brasil aos portos do Peru, a partir de Rio Branco e Porto Velho. Para evitar o risco de desindustrialização, assunto que está em pauta no Brasil atualmente, será necessário tomar medidas de mais longo prazo, como investimento em qualificação da mão de obra e reformas institucionais. "Tenho esperança de que isso aconteça, mas admito que não é uma esperança muito realista", diz Roett, citando as dificuldades do sistema político.
Na parte de cima da América Latina, pontifica o "laissez faire, laissez passer". "As coordenadas para o crescimento não estão no protecionismo, mas na abertura comercial, e não estão na expropriação de ativos, mas na garantia de livre empresa", afirmou o presidente mexicano Felipe Calderón, aplaudido de pé. O discurso era uma alfinetada diretamente dirigida ao Brasil, em resposta à mudança no regime automotivo binacional com o México no mês passado, que reduziu drasticamente a importação de carros vindos do país de Calderón.
O caso mexicano é particular e ilustra a dinâmica da economia latino-americana nas últimas duas décadas. Com a criação do Nafta (Acordo de Livre-Comércio da América do Norte, na sigla em inglês), o país foi inundado de investimentos americanos - com destaque para as chamadas indústrias maquiadoras, que aproveitavam a eliminação das tarifas e os baixíssimos salários para montar produtos sem transferir tecnologia - e se tornou a principal economia do continente.
Já no século atual, com a ascensão da China, seguida da alta vertiginosa dos preços de produtos primários, a balança do continente passou a pesar a favor do Brasil. Os países cuja política econômica estava voltada para o mercado interno foram favorecidos, ao promover uma redistribuição da renda e uma alta dos salários. Até 2004, Brasil e México tinham PIBs em nível semelhante, mas, desde então, o produto brasileiro disparou, permitindo ao país a manifestação de ambições diplomáticas mais vistosas.
A ascensão do Brasil não foi bem recebida pelos mexicanos. O país investe numa oposição ativa contra a candidatura brasileira a um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. Na votação para a FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação), no ano passado, o México foi o único país latino-americano a não apoiar o candidato brasileiro, José Graziano, que acabou eleito.
No mês passado, os chefes de Estado dos países da Aliança do Pacífico, formada por México, Peru, Chile e Colômbia, se reuniram pela primeira vez em Santiago. O grupo, constituído pelos principais países do bloco mais ligado à economia americana - portanto, contrapostos à corrente inspirada em iniciativas como o Mercosul -, tem no México seu integrante mais entusiasmado.
Para Rothkopf, é normal que a ascensão internacional do Brasil provoque reações de preocupação - e de ciúmes - em alguns de seus vizinhos, notadamente aqueles que aspiravam a um destino semelhante. O México, em particular, tem sido uma barreira eficaz contra algumas pretensões do Brasil também junto ao governo americano, diz Rothkopf. Um dos motivos da lentidão no avanço do governo Obama para o reconhecimento do pleito brasileiro na ONU é a tentativa de evitar ferir os sentimentos mexicanos. "Será que as Filipinas têm ciúme da proeminência da China?", pergunta Rothkopf. "Será que o Canadá tem ciúmes dos EUA? Ninguém aqui fica cheio de dedos com os ciúmes do Canadá."
Roett acrescenta mais uma causa para a irritação mexicana com o Brasil. "O Itamaraty concentra seus esforços na integração da América do Sul", diz. Em 2000, foi feita a primeira reunião de presidentes sul-americanos. O México reclamou e acabou obtendo status de observador. Vicente Fox, presidente mexicano de 2000 a 2006, quis integrar o país ao Mercosul, mas foi rejeitado. "A proximidade com os EUA sempre incomodou a América do Sul, não só o Brasil."
Por outro lado, o Brasil tem uma situação melhor do que as demais potências ascendentes, no objetivo de conjugar a posição global e a local. Ao contrário da China, e principalmente da Índia, não tem conflitos históricos ou de fronteira com seus vizinhos. E, ao contrário da Alemanha que crescia na época de Otto von Bismarck, "há 140 anos que o Brasil não entra em guerra no continente", ressalta Rothkopf.
Roett cita o barão do Rio Banco, "essa figura adorável", para assinalar a tradição brasileira de trabalhar em conjunto com os vizinhos, em vez de escolher a via do confronto. "Ao contrário de vários outros países da América do Sul, o Brasil não tem quase nenhum conflito de fronteiras." O embaixador Simões segue na mesma linha de Roett. Entende que as eventuais desconfianças dos vizinhos quanto às verdadeiras intenções do Brasil são compreensíveis, mas equivocadas, e afirma que "o Brasil não quer ser rico, mas crescer com seus vizinhos".
Outrora a maior rival do Brasil no continente, hoje a principal parceira comercial e política abaixo do Rio Grande, a Argentina, na pessoa da presidente Cristina Kirchner, foi frustrada, na cúpula de Cartagena, em seu propósito de obter uma declaração conjunta sobre a disputa das ilhas Malvinas. Também muito distante do encontro dos empresários, Cristina voltou para Buenos Aires ainda na manhã de domingo para preparar a expropriação da petroleira YPF, até o momento de capital espanhol, no dia seguinte.
A única reação significativa à decisão de Cristina veio da Espanha, que ameaçou com retaliações e avaliou a parte da companhia que terá de vender em US$ 10,5 bilhões. Em perspectiva histórica, o pouco barulho é significativo. Há menos de uma década, uma decisão drástica como a da Argentina teria provocado uma reação em cadeia no continente, como nas crises políticas dos anos 1960 e 1970 e na montanha-russa financeira dos anos 1980 e 1990.
Já não é assim. "A Argentina está claramente isolada", diz Julia Sweig. "Os investidores sabem que o ambiente econômico e político do continente está sólido e estável." Para Rothkopf, "a Argentina só fez o que fez porque está sem dinheiro. Acredito que entrará em crise muito em breve".
Do outro lado do panorama continental, os países que gravitam em torno dos EUA têm no baixo custo da mão de obra um de seus principais ativos e na violência urbana a principal debilidade. Jornais favoráveis ao governo colombiano festejavam os índices animadores do país, como a inflação de apenas 3,4% no ano passado e o crescimento de mais de 100% das exportações nos últimos cinco anos.
Mas também recordavam o desemprego persistente em 11,9% da população econômica ativa (no Brasil, de 5,7% em fevereiro) e um dos 20 salários médios mais baixos do mundo. Não é à toa que a principal reação contra os TLC nos Estados Unidos tenha partido da central sindical AFL-CIO, preocupada com a migração da mão de obra para países de salários mais baixos, que, graças a essa condição e aos acordos de livre comércio, exportariam produtos de menor preço para os EUA - com ganho certo em geração de postos de trabalho e divisas.
Se existe a divisão na economia, no âmbito político a equação é outra. "Caminhamos do Consenso de Washington para o consenso sem Washington", comentou, em Quito, o presidente do Equador, Rafael Correa, o único a boicotar a cúpula em razão da ausência de Cuba em Cartagena, uma exigência americana.
Nos debates a portas fechadas, os Estados Unidos ficaram "solos, solitos", ironizou o chanceler da Venezuela, Nicolás Maduro, que representava o presidente Hugo Chávez, ausente por doença. A política interna é citada como principal entrave à atuação dos EUA no continente. "Para alguém que, como eu, trabalhou tanto com a América Latina, é uma pena que o continente não receba mais atenção dos EUA", diz Donna Hrinak. A ex-embaixadora no Brasil faz a ressalva, porém, de que uma das principais funções da diplomacia americana, hoje, é criar condições para a atuação do setor privado. "Mas o setor privado, adiantando-se aos diplomatas, "já busca intensamente maneiras de investir no continente, particularmente no Brasil."
Para Julia Sweig, "a América Latina deveria ser uma região importantíssima para os EUA". A explicação, paradoxal segundo ela, está justamente na tranquilidade e na solidez da região. A política externa americana se concentra em regiões de conflito e instabilidade que possam colocar em risco a segurança alimentar, energética e econômica do mundo. Trata-se de uma visão, segundo Kellie Meiman, baseada na "realpolitik": uma diplomacia baseada em preocupações práticas e imediatas. "Os EUA já perderam a influência que tinham no continente, isso é fato consumado", diz Sweig.
Maduro exagerou ao falar da solidão americana. Os Estados Unidos ficaram em companhia do nada tropical Canadá em sua intransigência em relação a Cuba, na resistência a discutir uma mudança na política antidrogas no Continente e na oposição a se debater a reivindicação argentina pelas Malvinas. E até Felipe Calderón, antes de chegar à Colômbia, passou por Cuba para se encontrar com Raúl Castro.
Neste "consenso sem Washington", a estrela de Hugo Chávez esmaece. A tendência é para o predomínio dos presidentes eleitos pela esquerda, mas com compromissos de manutenção de políticas econômicas favoráveis ao meio empresarial. É o caso de Dilma Rousseff, do peruano Ollanta Humala, do uruguaio José Mujica - cujo país acaba de subir no rating das agências de classificação de risco - e do salvadorenho Mauricio Funes.
O grupo começa a ganhar a adesão de uma geração eleita pela direita e interessada em políticas sociais. Estão no grupo o colombiano Santos, que promove uma reforma fundiária que beneficia as famílias de camponeses atingidas pelos grupos de extermínio, e o guatemalteco Otto Pérez, defensor de investimentos em saúde e educação no tratamento da violência urbana.
Em ambos os lados do espectro político, a referência evocada é quase sempre a mesma: o ex-presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva. Lula virou uma espécie de símbolo na região porque foi, nas palavras de Donna Hrinak, o primeiro a chamar para os próprios latino-americanos o peso da responsabilidade de resolver os problemas do continente. A transição política suave entre o governo do PSDB e o do PT também é citada como prova da maturação do continente, em paralelo com o controle continuado da inflação e a ênfase em políticas sociais.
Um elemento citado por diplomatas para explicar a transformação de Lula em "grife" na política continental é o sucesso em provocar a sensação, na população, de que a vida está melhorando de fato. Mesmo em países com grande sucesso econômico, como o Chile, o orgulho com a força financeira pode ser eclipsado pela ausência dessa sensação. O Chile sofreu com vastos protestos estudantis no ano passado e seu presidente, Sebastián Piñera, não goza de bons índices de popularidade.
Aproveitando a aproximação, primeiro da União Europeia e depois, principalmente, da China, esses países estão conseguindo conjugar a liberdade de mercado com a atenção a problemas sociais. A retórica inflamada de Hugo Chávez empalidece diante da capacidade que países como o Brasil e o Peru - em que a eleição de Humala, no ano passado, causou a mesma apreensão que a vitória de Lula em 2002 - têm demonstrado de produzir crescimento econômico com sucessos na área social, sempre com independência de políticas, mas sem bater de frente a cada momento com os EUA ou os mercados.
Para ser protagonista dessa nova tendência, falta a Dilma certos gestos de apelo popular, nos quais Lula sempre foi pródigo. Em Cartagena, a presidente não bebeu cerveja em uma boate, como a secretária de Estado Hillary Clinton. Jantou em um restaurante refinado da cidade colombiana e se retirou, sem acenar para turistas brasileiros. "O Piñera é mais simpático", lamentou uma paulistana a passeio. O presidente do Chile, apesar de não fazer parte do grupo que reivindica o legado de Lula, visitou comunidades carentes durante sua estadia na Colômbia.
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