Os países-membros da Organização Mundial do Comércio (OMC) chegaram a um consenso considerado surpreendente por alguns, ontem, para continuar a examinar o impacto de desalinhamentos de divisas sobre o comércio, como queria o Brasil. Como sempre ocorre na OMC, agora haverá negociação sobre qual aspecto específico vai entrar na agenda do próximo debate e quando. O Brasil deixou claro que não espera resolver o problema de câmbio na OMC, e sim pavimentar o terreno para a criação de um novo mecanismo de defesa comercial. "O que o Brasil quer é um alívio para o setor privado dos efeito provocados por desvio cambial", disse o embaixador brasileiro, Roberto Azevedo.
No primeiro grande seminário sobre câmbio e comércio na OMC, organizado a pedido do Brasil, os EUA e a Europa insistiram que a China mantém o yuan desvalorizado para apoiar suas exportações e baixar o desemprego. A China, por sua vez, acusou os EUA de negligenciar seu papel na gestão do dólar, a moeda de reserva internacional.
A Venezuela foi o único país que apoiou explicitamente a política cambial chinesa. E na sala fechada pouquíssimos fizeram referência a barreiras levantadas pelo Brasil contra importações, conforme relatou um embaixador asiático.
O seminário "elevou a conscientização" sobre a complexidade do impacto do câmbio no comércio, segundo o presidente do Grupo de Trabalho sobre Finanças e Comércio, embaixador Mark Glass, de Hong Kong.
"Os países-membros estão conscientes de que taxas de câmbio são parte do ambiente externo da OMC e podem ser vistos como um irritante nas relações comerciais e que cada país pode, em diferentes períodos, estar de um ou outro lado da situação sobre valor da moeda", acrescentou.
Ele relatou que, na sessão com o setor privado, alguns empresários enfatizaram os custos provocados pela volatilidade, enquanto outros focaram nas dificuldades mais permanentes de competir com países com moedas desvalorizadas. Insistiram que volatilidade e desalinhamento cambial têm um impacto particularmente severo sobre pequenas e médias empresas.
Alguns insistiram que, na ausência de ajuste cambial, a elevação de tarifa de importação era o último recurso. Outros consideraram que as companhias precisam sobretudo ter o melhor nível de produtividade e o mix de produção doméstica e importações.
Na sessão com governos, incluindo representantes dos bancos centrais da Índia e do Canadá, Mark Glass relatou que alguns membros reconheceram que mudanças erráticas nas taxas de câmbio dificultam a tarefa das autoridades, porque minam o nível da proteção negociada na OMC. No entanto, insistiram que a taxa de câmbio pode ser apenas parte do ajuste, e que é preciso atacar as raízes dos problemas, incluindo gestão de política monetária, dos fluxos de capital de curto prazo e falta de reformas estruturais em certos países.
Por sua vez, a sessão com organizações internacionais (FMI, Banco Mundial, OCDE e Unctad), discutiu um cenário mais amplo sobre como reequilibrar a economia mundial, com necessidade de "desalavancagem" (redução do endividamento) nos países em desenvolvimento e de o crescimento ser mais baseado na demanda doméstica em emergentes como a China.
"Dois anos atrás falar em trazer câmbio para a OMC era considerado irrealista. Agora, esperamos mover de conceito para a realidade", afirmou o embaixador brasileiro Roberto Azevedo.
Se as próximas discussões levarão um dia à negociação sobre novo mecanismo de defesa comercial é algo no qual muitos não apostam.
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