Fonte: O Globo Autor: Mauro Laviola |
Não obstante as inúmeras e repetidas declarações dos governos em prol da integração regional, os atos não acompanham os discursos. O caso da pendência entre Brasil e México em torno do acordo automotriz, que vigora desde 2003, é emblemático. Após o Brasil obter superávits comerciais com aquele país durante os cinco primeiros anos, a balança de transações passou a pender para o lado mexicano na proporção inversa dos déficits apurados anteriormente. No final do ano passado, frente ao resultado negativo do acordo na casa dos US$ 2 bilhões, o governo brasileiro anunciou a disposição de denunciá-lo caso o parceiro não aceitasse sua renegociação visando a reequilibrá-lo e evitar uma "avalanche" de veículos mexicanos no país.
A primeira pergunta cabível é por que o México, a partir de 2008, passou a ter saldos comerciais crescentes no Acordo de Complementação Econômica N 55? Na verdade não é mistério para ninguém que os interesses comerciais desse setor movem-se em função de acertos entre as empresas multinacionais instaladas nos respectivos países. Por isso, o que moveu a balança do acordo foi a decisão de algumas dessas empresas transferirem do Brasil para o México a montagem de certos modelos anteriormente aqui armados. E por que isso ocorreu? Porque os custos de fabricação envolvendo maiores encargos trabalhistas, perversa carga tributária que assola a produção industrial brasileira em geral, além da perpetuação do real apreciado, traduzem um custo de fabricação sensivelmente maior do que o vigente naquele país.
O segundo ponto importante da questão prende-se às negociações propriamente ditas para tentar reverter o quadro comercial negativo do Brasil. Os muitos anos de experiência em negociações internacionais me ensinaram que a pior forma de iniciar uma negociação é ameaçar a outra parte. Foi justamente o que fez o governo brasileiro anunciando eventual denúncia do acordo antes mesmo de haver uma primeira abordagem bilateral. Note-se que a denúncia unilateral do ACE-55, sem que haja um entendimento prévio entre as partes, não serve aos interesses imediatos do governo brasileiro, porque o Artigo 13 reza que as obrigações do denunciante permanecem válidas por 14 meses.
É relevante notar, também, que, frente o atual quadro do comércio exterior brasileiro, o saldo negativo do acordo não suaviza as estimativas de ocorrer um déficit comercial brasileiro de bens manufaturados estimado para o corrente ano em cerca de R$ 80 bilhões. O somatório do custo Brasil mais a falta de diversificação de mercados, com perda relativa de acesso aos parceiros da Aladi pela crescente ação dos países asiáticos e as perspectivas sombrias de crescentes restrições argentinas às importações em geral, colocam nossas exportações em xeque.
Outro ponto nevrálgico dessa briga com os mexicanos é que ela sequer interessa ao próprio setor automotivo brasileiro conforme declarações públicas da Anfavea e de diversas empresas do setor de autopeças. Na esteira desse problema fica mais fácil compreender por que as duas maiores economias latino-americanas têm um comércio bilateral ínfimo em relação às suas respectivas potencialidades industriais e corporativas. Este é mais um exemplo de como as ações deletérias dos Estados no sentido de preservar, a todo custo, suas soberanias nacionais, invalidam os repetitivos discursos integracionistas, que poluem a região e se afastam cada vez mais da realidade.
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sexta-feira, 16 de março de 2012
Comércio na contramão
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