Pacote de 100 bi terá supervisão. Bloco estuda controle de capital caso a Grécia saia do euro
Autoridades da União Europeia (UE) e da Alemanha desmentiram ontem a afirmação do presidente do Governo da Espanha, Mariano Rajoy, de que o pacote de 100 bilhões, acertado no fim de semana para ajudar os bancos do país, viria sem condições ou amarras. De acordo com o comissário de Concorrência da UE, Joaquim Almunia, e o ministro de Finanças alemão, Wolfgang Schäuble, do mesmo modo como ocorreu em outros resgates, a troika - grupo formado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Central Europeu (BCE) e Comissão Europeia - deverá supervisionar a aplicação da assistência financeira. A UE também já discute um plano de contingência para uma eventual saída da Grécia da zona do euro. Este plano incluiria, segundo fontes ouvidas pela agência Reuters, um controle de capital sobre o país, para evitar retiradas massivas dos bancos. Tal controle, acrescentaram estas fontes, poderia ser estendido a outros países.
- Claro que haverá condições. Quem dá dinheiro nunca o dá de graça - disse Almunia à rádio Cadena Ser da Espanha.
Ele acrescentou que o FMI ficará plenamente envolvido no acompanhamento do pacote, apesar de não contribuir com fundos, e os bancos que receberem ajuda terão que apresentar um plano de reestruturação.
- O Estado espanhol está tomando os empréstimos, a Espanha será responsável por eles. Haverá também uma troika. É claro que haverá supervisão para garantir que o programa seja cumprido, mas isso refere-se apenas à reestruturação dos bancos - disse, por sua vez, Schäuble à rádio Deutschlandfunk.
Segundo o jornal espanhol "El País", outras fontes comunitárias creditaram o discurso de Rajoy a uma "manobra política interna", mas a ajuda está "estreitamente vinculada ao pacto de estabilidade, diga o que disser o governo". O porta-voz de Assuntos Econômicos, Amadeo Altajaf, disse ontem que mais dívida significará a exigência de mais rigor fiscal e, consequentemente, uma supervisão externa mais estreita não só de seu sistema financeiro, mas igualmente de sua política fiscal.
Com relação a um possível controle de capitais, as fontes ouvidas pela agência Reuters disseram que o plano faz parte de uma série de medidas de contingência para o caso de uma saída da Grécia da zona do euro. As fontes acrescentaram, porém, que tais medidas são, até agora, um exercício teórico, pois consideram pouco provável que a Grécia abandone o euro.
Dívida do país pode saltar dez pontos percentuais
Com o socorro, os espanhóis vivem agora em um país ainda mais endividado. Dependendo do valor exato da ajuda europeia, acertada no último sábado, e das condições de pagamento do empréstimo, a dívida espanhola, que ronda 70% do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país), pode dar um salto de dez pontos percentuais. Além disso, os juros que serão cobrados pelo empréstimo de 100 bilhões se traduzirão, necessariamente, em mais déficit para a Espanha, segundo os especialistas, embora o governo negue. Trocando em miúdos, os espanhóis sentirão os efeitos do resgate: aperto fiscal e mais desemprego.
- Com ou sem resgate, a Espanha teria que tomar mais medidas de austeridade, mas a grande diferença é que, agora, com este socorro, as recomendações da UE se transformaram em exigências. E o que estava sendo feito gradualmente será acelerado - diz o economista Florentino Felgueroso, pesquisador da Fundação de Estudos de Economia Aplicada (Fedea).
A Espanha fechou 2011 com déficit próximo a 9% do PIB. Seu compromisso com a UE é de acabar 2012 com 5,3% e, 2014, com 3%. Este socorro de 100 bilhões está vinculado ao cumprimento do pacto fiscal. Ou seja, sem a redução do déficit, a UE fechará a torneira e o dinheiro deixará de sair. A Espanha será severamente vigiada, para que não se desvie de seu objetivo. Para isso, terá que seguir as recomendações da Comissão Europeia como aumentar o imposto indireto sobre o consumo (IVA, Imposto sobre o Valor Agregado) pago pelo consumidor final; acelerar a reforma das pensões (que inclui colocar em vigor imediatamente o aumento da idade de aposentadoria de 65 a 67 anos) e fazer alguns acréscimos à reforma trabalhista.
- Todas as previsões dão conta de que este ano o desemprego continuará aumentando. Sem dúvida. Não se espera que estas medidas tenham um efeito a curto prazo. Este socorro não é uma panaceia, não vai ajudar a criar postos de trabalho. Pelo contrário. A curto prazo vai destrui-los - ressalta o economista Raúl Ramos, da Universidade de Barcelona.
O resgate, cujo objetivo é acelerar a reestruturação do setor financeiro, não livra os bancos de cortes de gastos para que passem a viver com o dinheiro que receberão. Um estudo do BBVA prevê a necessidade de fechamento de oito mil agências de bancos espanhóis, ou seja, 26% do total, o que se traduz em 35 mil funcionários (cerca de 15%) no olho da rua. A título de comparação, o setor da construção, cuja bolha imobiliária foi financiada pelos bancos, perdeu, desde 2008, cerca de 40% de seus postos de trabalho.
Após um difícil fim de semana, o pior dos quase seis meses de mandato de Mariano Rajoy, no qual o presidente do Governo viajou à Polônia para ver a seleção espanhola de futebol jogar contra a Itália na Eurocopa, os espanhóis mostraram indignação nas redes sociais, perguntando-se quem vai socorrê-los em seus desastres financeiros pessoais.
Apesar de sua "ausência histórica", chamada assim por alguns meios de comunicação espanhóis, nos primeiros momentos do impopular resgate aos bancos, Rajoy tentou, na sua aparição pública de domingo, transmitir calma. Apresentou o socorro (que ele chamou de "abertura de uma linha de crédito") como uma vitória de seu governo. O ministro de Economia, Luis de Guindos, também ressaltou que não haveria condicionamentos macroeconômicos e fiscais à ajuda financeira.
- Se forçam demais o ritmo dos ajustes pode ser contraproducente. Sem tomar medidas para reativar a economia, a situação pode piorar - disse Raúl Ramos.
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