Autor: Jamil Chade
O governo brasileiro foi o recordista na aplicação de novas medidas protecionistas no mundo nos últimos seis meses, desde que a crise econômica internacional ganhou uma nova intensidade. Os dados são da ONU, OMC e da OCDE, que fizeram o levantamento do protecionismo e vão levar os resultados aos líderes do G-20, para alertar que a promessa dos países de que não recorreriam a barreiras não está sendo cumprida.
Em quatro anos de crise, o acúmulo de barreiras já atinge 4% do comércio mundial - US$ 500 bilhões, o equivalente a toda a exportação brasileira e indiana reunidas. Ou todo o comércio exterior dos 54 países africanos.
A Organização Mundial do Comércio (OMC), a Organização das Nações Unidas (ONU) e a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) alertam que a ameaça protecionista cresceu e já é um "risco para a economia global". As entidades pedem que governos "resistam à tentação de políticas nacionalistas", destacando um retorno da "retórica protecionista" com a adoção de políticas de substituição de importação que estão aumentando a tensão entre os países.
No total, o Brasil adotou 17 novas barreiras contra importações, número que superou todos os demais países, inclusive a Argentina, acusada de adotar uma postura nacionalista.
Além disso, o governo brasileiro anunciou nos últimos seis meses um total de cinco medidas de apoio à indústria nacional, algumas delas questionadas já por Estados Unidos e Europa.
Só somando as medidas de incentivo adotadas pelos países europeus é que se consegue superar a marca brasileira. No total, Itália, Espanha, França, Alemanha e os demais europeus iniciaram 13 planos de incentivo à indústria local. Nenhum governo, porém, chegou perto dos cinco planos do governo de Dilma Rousseff. Estados Unidos e Rússia, por exemplo, adotaram dois planos de incentivo cada.
Mas é na questão tarifária e aduaneira que a marca do protecionismo brasileiro é mais nítida. As 17 medidas brasileiras superam as 14 da Argentina e Estados Unidos, 12 da Europa, 10 da Índia e 8 da China.
Nos últimos dois anos, o Brasil ainda foi o líder absoluto na implementação de medidas antidumping. Entre outubro de 2010 e abril de 2011, foram 25 medidas nesse sentido. Já entre outubro de 2011 e abril de 2012, o número caiu para 16. Mas ainda assim foi a maior do mundo. Os europeus adotaram 13, ante 12 dos Estados Unidos. No total, foram 73 medidas nesse sentido.
Outra tendência foi a adoção de políticas para limitar licitações públicas a empresas nacionais. O documento chama a atenção para a questão do conteúdo nacional no setor de telecomunicações. No leilão do 4G, a Anatel estabeleceu critérios para uso de produtos nacionais.
Sem citar nominalmente o Brasil, o levantamento alerta que "essas ações podem mandar um sinal errado e iniciar sentimentos protecionistas e até retaliações". O documento também aponta que a abertura de mercados à concorrência estrangeira reduziria os gastos públicos.
Acúmulo. Se a tendência brasileira preocupa, as entidades alertam que a onda protecionista é mesmo mundial. Desde outubro de 2011, 124 medidas foram adotadas por governos do G-20, afetando 1,1% do comércio desses países, mais que nos semestres anteriores. O que mais preocupa é que barreiras adotadas desde 2008, tidas como "temporárias", jamais foram retiradas.
Hoje, o acúmulo de barreiras já afeta 3% do comércio global e 4% do intercâmbio do G-20. Desde a quebra do Lehman Brothers, foram 802 medidas. Só 18% foram retiradas, e a taxa de revogação das medidas vem desacelerando.
As entidades alertaram que, na cúpula do G-20 em Cannes, em novembro, os líderes se comprometeram a não elevar tarifas nem adotar medidas protecionistas. Mas admitem que o fraco crescimento da economia mundial e a alta do desemprego estão "testando a decisão política de resistir ao protecionismo".
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