O recuo na importação brasileira em abril chegou a segmentos que ainda mantinham um pouco mais de fôlego nos desembarques, alcançando não só setores relacionados a matérias-primas e intermediários como também a bens de consumo. A queda de importação ou a forte desaceleração nos desembarques de alguns setores são considerados indicadores de uma demanda doméstica mais enfraquecida e reflexo de uma produção industrial desacelerada. Representantes de setores como calçados, têxtil e vestuário indicam também influência da "Maré Vermelha", fiscalização da Receita Federal com verificação física no desembarque de mercadorias deflagrada em março.
Segundo dados da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex), em abril a importação de veículos apresentou queda de 6,9% na comparação com o mesmo período do ano passado. No acumulado do ano, há crescimento de 3% em relação ao primeiro quadrimestre de 2011. A importação de material eletrônico e de comunicações também teve queda de importação em abril, de 7,6%, comportamento que contrasta com o do acumulado do ano, período no qual houve crescimento de 3% (ver quadro).
Segmentos de não duráveis também apresentaram desaceleração forte ou queda em abril. A importação de confecções, em abril, cresceu 11,9%. No acumulado do ano, a elevação é de 40,9%. A preparação de couros e calçados teve queda em abril de 25,5%. No acumulado, o aumento é de 0,8%. Rodrigo Branco, economista da Funcex, lembra que os dados de abril mostram um recuo ou desaceleração de importação mais generalizado entre os segmentos de bens de consumo. "Nos meses anteriores a desaceleração já estava mais forte nos bens de consumo duráveis. Em abril ela chegou a segmentos com menor elasticidade, como calçados e vestuário, o que é indício de demanda doméstica menos aquecida."
Heitor Klein, diretor da Associação Brasileira da Indústria de Calçados (Abicalçados), diz que um dos fatores mais importantes para a redução na importação do setor em abril deve ser creditada à fiscalização "Maré Vermelha". A operação foi deflagrada em 19 de março, mas, segundo ele, teve resultados maiores a partir de abril, como também aponta Fernando Pimentel, diretor-superintendente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit).
Os dois também acreditam que há um componente de sazonalidade, já que abril é um mês de entressafra entre coleções. "Mas há também uma esperada retração no ritmo de aumento do consumo doméstico. Depois de três anos de crescimento no volume de vendas no varejo do setor, o mercado chega a um nível de saturação já previsto para este ano", acredita Klein. Ulrich Kuhn, presidente do Sinditex, que reúne indústrias de têxteis e vestuário de Blumenau, faz análise semelhante. "Essas importações que desembarcaram em abril foram encomendadas, em média, seis meses antes. Ou seja, não há influência da atual desvalorização do real frente ao dólar, mas é reflexo de uma saturação do mercado que talvez leve o ritmo importação a uma estabilização ou desaceleração nos próximos meses."
O professor da Unicamp e consultor do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Julio Gomes de Almeida, diz que os dados de importação em abril foram surpreendentes. Ele lembra que é necessário esperar o comportamento dos desembarques nos próximos meses, mas a redução da importação pode indicar agravamento da retração industrial e o fim de um ciclo de crescimento no consumo de bens duráveis. Ele lembra que, na média diária, os desembarques em abril tiveram redução de 3,1% na comparação com o mesmo do ano passado, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic).
A extensão de efeitos de desaceleração ou redução em segmentos como calçados e vestuário, diz Almeida, pode indicar cautela. "Grandes varejistas podem estar de olho nas tendências de consumo e resolveram colocar um pé no freio. Como a decisão de comprar de fora requer antecedência, é a importação que costuma pagar mais o preço das viradas de ciclo", diz. Com isso, a insegurança do mercado doméstico pode contribuir para um menor coeficiente de importação nos próximos meses. "Mas será uma alteração pouco relevante, já que os problemas estruturais da indústria ainda não foram resolvidos."
Welber Barral, sócio da Barral M Jorge Consultores Associados, também acredita que a redução de importação em abril reflete a queda de demanda das vendas do varejo e a perspectiva de desaquecimento. Se houver estabilização em nível mais elevado, o câmbio também vai contribuir, acredita, para a manutenção dessa tendência nos próximos meses. "As empresas provavelmente reduzirão a importação, porque farão menos estoque."
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