A provável chegada do socialista François Hollande à Presidência da França, como indicam as pesquisas de intenção de voto, deve tornar a relação com o Brasil "mais institucional" e "descentralizada". Mas, mais importante, o protecionismo pode aumentar qualquer que seja o resultado, e não só em relação à agricultura, conforme avaliações ouvidas pelo Valor de fontes da diplomacia e analistas. No próximo domingo, Hollande (PS) disputa com o presidente-candidato Nicolas Sarkozy (UMP) o segundo turno das eleições.
Apesar da expectativa de que algo mude num eventual governo Hollande em função de equipes e estilos diferentes, o clima é de "otimismo" em relação à transição porque existe a "percepção de que a política de Sarkozy" de aproximação e parceria com o Brasil "foi correta" e deve ser mantida, afirmou um diplomata brasileiro.
"Existe um sentimento de que a França precisa de uma potência emergente como parceira para competir com outras potências", acrescenta. Ele observa que 38 das 40 empresas que fazem parte do CAC 40, o índice de ações da bolsa de Paris, estão atualmente no Brasil, por conta do potencial de crescimento desse mercado.
O atual presidente francês estreitou relações com o Brasil em seu governo, principalmente durante o mandato do ex-presidente Lula, e fez parcerias em áreas como defesa, tecnologia e ciência, além de cooperação econômica e comercial. Também apoiou a candidatura do Brasil ao Conselho de Segurança das Nações Unidas.
"Sarkozy era muito próximo de Lula. Com Hollande, a relação deve ser mais institucional.
Com Sarkozy, as coisas eram resolvidas entre o Elysée e o Planalto [sedes do governo francês e brasileiro, respectivamente], agora vai ser mais descentralizado", avalia o diplomata.
Em um cenário menos provável, conforme as sondagens, de vitória de Sarkozy no segundo turno, a relação entre Brasil e França "continua como está hoje", acrescenta a fonte da diplomacia.
Ainda que mais institucional, a relação Brasil-França num possível governo Hollande deve ser " facilitada" por um conhecimento pessoal de muitos dirigentes socialistas e petistas, diz o diplomata. Ele lembra que recentemente o candidato socialista se referiu ao governo Lula como um exemplo "da esquerda que teve sucesso".
Para o professor Alfredo Valladão, especialista em América Latina da Universidade Sciences Po, a proximidade entre o PS francês e o PT brasileiro, não fará "muita diferença" num eventual governo Hollande. "Ajuda um pouquinho na comunicação, mas na relação em si, não muda nada. (...) Qualquer um que ganhe, acho que teremos mais problemas com a França, porque o discurso de todos os candidatos, neste momento de crise, é "temos que nos fechar mais, que proteger mais o país, temos que começar a subsidiar nossa indústria, temos que fazer barreiras protecionistas, inclusive ecológicas"".
O diplomata brasileiro reconhece que a resistência em relação à abertura na área agrícola continuará a existir na França num governo Hollande, pois a concorrência com países como Brasil e Argentina nesse segmento "assusta" os franceses. Mas ele considera que o discurso dos candidatos defendendo maior proteção à indústria por conta da crise na zona do euro é mais voltado a países como a China e do Sudeste Asiático, que têm mão de obra barata. "O Brasil já deixou de ser país de mão de obra barata e é visto com um país onde pode se estabelecer uma plataforma [de produção]", observa.
Valladão tem dúvidas se um governo Hollande seria tao "pró- Brasil" como o de Sarkozy. "Não sei se Hollande seria tão pró-brasileiro. (...) A esquerda no poder é um pouco mais sensível a questões como ecologia, direitos humanos, e isso pode até complicar a relação [com o Brasil]. A direita é menos sensível a isso".
Para o professor da Sciences Po, uma França mais protecionista pode influenciar as decisões da União Europeia, já que o país "tem força para carregar junto vários outros [países]". Além de problema para o Brasil, uma França "mais fechada", querendo subsidiar mais para sair da crise e disposta a impor barreiras ambientais e técnicas, pode significar um risco para a recuperação da economia mundial, diz Valladão.
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