Não faz muito tempo, falava-se animadamente na Índia da possibilidade de o país ultrapassar a China e se tornar a economia de grande porte de crescimento mais acelerado do mundo. Mas a tartaruga indiana, longe de vencer a lebre chinesa, está indo para trás. O crescimento do país não avançou lentamente para a casa dos dois dígitos. Em vez disso, três bancos de investimento rebaixaram sua avaliação das perspectivas da Índia. O Morgan Stanley diz que a desaceleração, resultante da paralisia da política econômica e da deterioração do ambiente externo, pode ser profunda e prolongada.
O símbolo da perda de simpatia por parte da Índia é a rúpia. Ela despencou mais de 17% no câmbio com o dólar este ano, para seu nível mais baixo já registrado. Isso deveria, pelo menos, ter contribuído para as exportações. Na verdade, elas encolheram, juntamente com a produção industrial, que caiu 3,5% em março.
O enfraquecimento da rúpia encareceu o petróleo e outros produtos importados. Isso ampliou um déficit em conta corrente já alarmante de cerca de 4% do Produto Interno Bruto (PIB). A perda de valor da rúpia também não é de nenhuma ajuda no front da inflação, que nunca esteve devidamente sob controle e que atualmente volta a tangenciar os 7%.
O Reserve Bank of India, banco central do país, a única parte econômica do governo que está, em certo sentido, funcionando, enfrenta um dilema clássico.
No mês passado, o BC reduziu as taxas de juros em meio ponto percentual, na tentativa de estimular o crescimento da economia. Mas, com a inflação assumindo o sentido errado, é pouco provável a continuidade de medidas desse tipo. A instituição pode ser até obrigada a aumentar novamente a taxa de juros.
Algumas das dificuldades da Índia estão fora do controle do governo. Ele não tem como influir na crise europeia nem no nervosismo do capital externo. O governo de Manmohan Singh, no entanto, tem de assumir boa parte da responsabilidade pelos atuais problemas. Há um crescente "déficit governamental" que acompanha o déficit em conta corrente e o déficit público, este último equivalente a quase 6% do PIB. Arranhada por sucessivos escândalos de corrupção e rachada por facções regionais e ideológicas, a coalizão no poder, comandada pelo Partido do Congresso, parece ter dormido ao volante.
Quando estava efetivamente desperto, o governo tendeu a causar verdadeiros danos. Foi o caso do Orçamento de março, quando propôs impostos retroativos sobre os investidores estrangeiros. Parecia ter em mira a Vodafone, uma empresa em processo de investir cerca de US$ 18 bilhões no país. As normas dos investimentos são tão mutáveis, as aprovações tão pouco transparentes e tão sujeitas à corrupção que até as grandes empresas indianas dizem estar encontrando melhores oportunidades de investimento no exterior. Se elas não conseguem negociar a confusão que impera sobre os investimentos na Índia, o que podem esperar as empresas estrangeiras?
Este mês forneceu um bom exemplo da falta de determinação do governo. Enfrentando crescentes prejuízos com a gasolina subsidiada, ele tentou elevar os preços em 11%. Mas, em 24 horas, sugeriu que poderia voltar atrás, em meio à furiosa oposição vinda de seu próprio e incontrolável partido.
A mudança de sentimento é um resíduo da reversão, do ano passado, da tão esperada legislação destinada a abrir o setor varejista. Naquela época, tanto quanto agora, a iniciativa foi caracterizada como prejudicial aos pobres. Mas, se sancionadas corretamente, essas reformas possibilitariam ao governo monitorar as transferências de dinheiro com mais eficiência e controlar o déficit, ao deixar de subsidiar a classe média. No mesmo sentido, a abertura do varejo aos grandes supermercados poderia prejudicar alguns pequenos comerciantes. Mas o benefício para a massa, em termos de redução dos preços, contrabalançaria de longe qualquer dano. Para fazer algum bem, os governos precisam estar preparados para fazer alguns inimigos.
Tudo isso é inquietante. Se os investidores estrangeiros se atemorizarem, a situação do balanço de pagamentos da Índia poderá deteriorar rapidamente. A Standard & Poor"s advertiu que poderá rebaixar a nota dos títulos soberanos da Índia se Nova Déli não conseguir pôr o déficit público sob controle. A Índia precisa, além disso, de um crescimento mais acelerado para tirar centenas de milhões de pessoas da extrema pobreza.
Singh, outrora decantado como o idealizador das reformas da economia, é agora habitualmente ridicularizado. Mais do que primeiro-ministro, ele é caracterizado como moço de recados de Sonia Gandhi, a dirigente do Partido do Congresso. De fato, Singh, de 79 anos, parece ter perdido qualquer ambição, bem como qualquer controle do governo que possa ter tido no passado.
Mas Singh tem pouco a perder. Ele deveria apostar todas as suas fichas e dar um último empurrão na liberalização da economia. Poderá até perder o cargo de premiê nessa tentativa. Mas isso seria infinitamente melhor para o país - e para o seu legado - do que sair docilmente como chefe de um governo que nada faz.
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