Sete países pressionam o Brasil para eliminar a discriminação contra veículos com menos de 65% de componentes nacionais, denunciada como incompatível com as normas da OMC. Essa política entrou em vigor há um mês e meio, com a cobrança de um IPI maior sobre os veículos com índice de nacionalização abaixo daquele limite. A medida prejudica as importações e ao mesmo tempo estabelece tratamentos diferentes para montadoras em operação no País. Formam o grupo EUA, União Europeia, Japão - três das maiores potências comerciais do mundo -, Hong Kong, Coreia, Austrália e Colômbia.
O imposto foi aumentado por decreto de 16 de setembro, mas a mudança começou a ser aplicada 90 dias depois, por determinação da Justiça. A medida, claramente protecionista e discriminatória, foi concebida no Ministério da Fazenda, que não consultou os setores do governo especializados em comércio internacional.
Representantes brasileiros na OMC, em Genebra, foram surpreendidos pela iniciativa. Nunca se pronunciaram publicamente sobre esse detalhe e são agora forçados, por dever funcional, a assumir a defesa de mais essa tolice cometida em Brasília. Mas nunca esconderam, em contatos informais, sua opinião sobre a qualidade desse tipo de defesa comercial. Em Genebra, a primeira reação de vários diplomatas, brasileiros e estrangeiros, foi de perplexidade, diante do primarismo da medida anunciada pelo Ministério da Fazenda.
O governo brasileiro tentou justificar sua decisão, apontando os problemas criados pela valorização cambial e pelas condições de competição de certos parceiros comerciais. A preocupação com a China sempre foi evidente, nesse e em outros casos, mas a proteção foi aplicada contra vários países, preservando apenas os sócios do Mercosul e o México. As autoridades agiram como se estivesse ocorrendo uma repentina invasão de automóveis importados, com grande prejuízo para a indústria instalada no País.
Caberiam, nesse caso, outras medidas previstas nos acordos internacionais. O estabelecimento de salvaguardas seria uma das iniciativas possíveis, mas isso envolveria uma comprovação dos danos e um complicado trabalho técnico. Se a preocupação central fosse com a prática de dumping por um país - como a China -, também haveria condições legais de ação e os problemas diplomáticos seriam circunscritos.
O governo preferiu uma solução mais exposta a censuras e tecnicamente mais precária, mas de aplicação rápida e relativamente simples. Como a alteração do IPI foi programada para valer durante um ano, a medida perderia vigor antes da conclusão de qualquer processo aberto no órgão de solução de controvérsias da OMC.
Os governos dos países exportadores sabem disso, mas não afastam a hipótese de iniciar um processo contra o Brasil. Por enquanto, há pressões combinadas contra o governo brasileiro.
Nenhuma das explicações apresentadas por Brasília até agora foi considerada satisfatória - nem poderia ser, dada a precariedade técnica da barreira estabelecida pelo governo brasileiro.
Um processo, de fato, perderia sentido com o fim da medida discriminatória. Mas nem todos se mostram convencidos do caráter temporário da barreira. Australianos expressaram essa dúvida.
Além disso, argumentam, os efeitos dessa política podem ser de longo prazo.
Negociadores de Hong Kong apontam o risco de a iniciativa brasileira estabelecer um padrão de protecionismo para outros países. É uma preocupação perfeitamente razoável. Se esse jogo funcionar para o Brasil, poderá funcionar para outros - as normas internacionais serão violadas com baixo risco de punição e todo o sistema será ameaçado.
Esse recurso primário ao protecionismo é desmoralizante. Expõe o País a ações de retaliação e, no fim das contas, é ineficiente como política industrial, porque em nada contribui para tornar a indústria mais produtiva e mais competitiva fora das fronteiras nacionais. Além de dificilmente defensável em termos legais, é uma resposta errada aos problemas da indústria.
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