Fonte: Valor Econômico |
Autor: Gustavo Loyola |
Nos últimos meses, o governo Dilma vem intensificando o uso de medidas protecionistas de variadas naturezas, consolidando a reversão, iniciada no governo Lula, do processo de liberalização do comércio exterior brasileiro, iniciado a partir do final dos anos 1980. Essa nova tendência é preocupante principalmente pelos seus efeitos negativos sobre o crescimento econômico do país, no médio e longo prazo. Muito embora a complicada conjuntura internacional sirva de oportuno pretexto, o retorno do protecionismo à pauta de Brasília tem a ver tanto com o ranço ideológico do petismo no poder quanto com as pressões urdidas por certos setores do empresariado industrial que, ameaçados pela competição externa, preferem tomar o atalho do fechamento comercial a enfrentar a dura batalha por reformas estruturais, muitas delas indigestas politicamente e de longo período de maturação. Em nossa própria história, há farta evidência indicando que o protecionismo não pode ser considerado como substituto para políticas públicas com foco no aumento da competitividade do país. Aliás, justamente o que está mais em falta no Brasil, notadamente depois que o PT ascendeu ao poder, são políticas consistentes para elevar a capacidade de competição dos produtos brasileiros, seja nos mercados domésticos, seja nos mercados externos. Uma política de competitividade, para ser bem sucedida, deve resultar de uma visão holística da questão econômica. A relativa baixa eficácia das iniciativas do governo neste campo é fruto principalmente da visão segmentada do problema que tem levado a ações isoladas, muitas delas agregando novas distorções a uma economia já carregada de distorções microeconômicas. Nesse contexto, o que se vê é o uso e abuso da manipulação do sistema tributário para gerar "benefícios", "isenções" e outras prebendas localizadas, assim como a concessão de linhas de crédito subsidiadas pelo BNDES e pelos outros bancos federais, em detrimento de políticas horizontais de competitividade. Por sua vez, a ineficácia dessas medidas amplia as pressões por proteção comercial e por intervenções no mercado cambial com vistas a depreciar o real. Quanto às medidas protecionistas, as ações recentes do governo brasileiro, como é o caso do aumento discriminatório do IPI na importação de veículos, parecem ter sido respostas improvisadas a "lobbies" bem orquestrados, sem grande consideração por suas repercussões negativas para os consumidores e para a política comercial brasileira. Com essa medida, o Brasil pode ter violado regras da Organização Mundial do Comércio (OMC) e acarretado efeitos negativos sobre a credibilidade do Brasil nos foros internacionais, além de sujeitar nossas exportações a retaliações pelos governos estrangeiros. A propósito, vale mencionar o contraste inexplicável entre a "valentia" do governo brasileiro na defesa do mercado interno contra a "invasão dos importados" e sua passividade diante de atentados ao comércio internacional e à letra dos tratados perpetrados por governos como os da Argentina de Cristina Kirchner, que prejudicam fortemente nossas exportações. Contudo, as repercussões deletérias do protecionismo sobre o potencial de crescimento no longo prazo são bem mais graves e persistentes. Há evidência abundante na literatura econômica indicando que o comércio internacional tem efeitos positivos para o crescimento econômico e para a redução da pobreza. A chave para o crescimento está no aumento do investimento e nos ganhos de produtividade, vetores que se correlacionam positivamente com a abertura da economia. Não foi por outra razão que países como a China incluíram a liberalização comercial no cardápio de reformas que os tornaram as economias que hoje mais crescem no mundo. Alguns críticos do livre comércio apontam casos de países que não se beneficiaram da abertura comercial. A questão, muitas vezes esquecida, é que o comércio internacional aumenta o potencial de crescimento, mas este somente se realiza na presença de instituições favoráveis à economia de mercado. De nada adianta abrir a economia e mantê-la manietada num ambiente que desestimula o investimento, o empreendedorismo e a inovação. Por isso, as reformas microeconômicas - ao lado do bom ambiente macroeconômico - são fundamentais para a liberalização comercial possa ter efeitos palpáveis sobre o desempenho da economia ao longo do tempo. Lastimavelmente, não há avanços perceptíveis em termos de reformas estruturais desde o primeiro mandato do presidente Lula. Ao contrário, acumularam-se os "pequenos assassinatos institucionais" que pouco a pouco comprometem o potencial de crescimento econômico sustentável do país. A presidente Dilma Rousseff, com sua ampla base parlamentar, pode acelerar a adoção de políticas de alcance sistêmico para elevar a competitividade do país, deixando de lado o uso de medidas que isolam sua economia dos fluxos internacionais de comércio. Se esta oportunidade for perdida, o Brasil pode ver sua capacidade de crescimento despencar no futuro imediato. Gustavo Loyola, doutor em economia pela EPGE/FGV, foi presidente do Banco Central e é sócio-diretor da Tendências Consultoria Integrada, em São Paulo. Escreve mensalmente às segundas-feiras. |
segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012
Escalada protecionista é preocupante
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