A Grécia aprovou ontem o tão esperado acordo que prevê um corte profundo nos empregos e gastos do governo para poupar o país de declarar uma inadimplência que poderá contaminar o sistema financeiro mundial.
Ao todo, o governo promete economizar mais de €3 bilhões em gastos neste ano, com a redução de benefícios aos aposentados e também a diminuição do salário mínimo em 22% para 586 euros (US$ 780), além da demissão de 15 mil funcionários públicos e o fim de dezenas de cláusulas de estabilidade no emprego. As informações fazem parte do rascunho do documento sobre o acordo firmado entre os líderes, obtido ontem pela imprensa.
O acordo, negociado desde julho, é um dos dois passos decisivos a serem tomados pela Grécia para receber uma operação de salvamento de € 130 bilhões (US$ 170 bilhões) de outros países europeus e do mundo inteiro. Ele foi anunciado pelo gabinete do primeiro-ministro da Grécia, Lucas Papademos, e passou a ser examinado de perto pelos ministros das Finanças dos 17 países que empregam o euro, em reunião realizada ontem em Bruxelas.
Ao chegar para o encontro, entretanto, o ministro das Finanças da Alemanha, Wolfgang Schaeuble, já deu a entender que as medidas podem não atender a todos os pré-requisitos para que o país seja socorrido.
A Grécia precisa da operação de salvamento até 20 de março para ter dinheiro suficiente para pagar o resgate de € 14,5 bilhões em bônus por vencer. Se o país não pagar, estará inadimplente. Os analistas financeiros temem que um episódio desse tipo possa gerar uma reação em cadeia semelhante ao colapso financeiro causado pela quebra do banco de investimento Lehman Brothers, em 2008.
A operação de socorro financeiro vai abrandar parte da incerteza que abala a Europa e o sistema financeiro mundial há mais de dois anos, mas não encerrará o drama do endividamento da Grécia.
O país continua em profunda recessão. A taxa de desemprego é de 20,9%, depois do terceiro ano consecutivo de queda da economia grega.
A Grécia terá de enfrentar dificuldades por vários anos para pagar suas dívidas, diz Domenico Lombardi, professor-visitante sênior da Brookings Institution. "O âmbito dos problemas que têm de ser administrados na Grécia é tão colossal e tão arraigado", diz ele.
Os esforços para corrigir esses problemas fundamentais, determinados pelos credores cada vez mais exasperados da Grécia - como a próspera Alemanha - estão, avançando, quando muito, lentamente. Se não forem resolvidos, a Grécia pode se ver de volta à beira da inadimplência.
A governo grego também está próximo de um acordo vital de alívio de endividamento com os bancos, fundos de hedge, fundos de pensão e outros investidores privados. Conforme as cláusulas do acordo experimental, os investidores privados trocarão €206 bilhões em bônus do governo grego por €30 bilhões em dinheiro, mais €70 bilhões em novos bônus.
O dinheiro provirá do pacote de €130 bilhões da União Europeia (UE) e do FMI. Os novos bônus terão uma taxa média de juros mais baixa e um vencimento mais dilatado. A combinação entre um principal menor a quitar quando os bônus vencerem e de juros menores para pagar a cada ano até o vencimento permite concluir que a Grécia gastará cerca de 70% menos do que desembolsaria sem o acordo.
A dívida detida pelo BCE e por outras instituições públicas responde por um terço do endividamento nacional da Grécia, e não é objeto desse acordo experimental.
No entanto, o presidente do BCE, Mario Draghi, disse ontem que o banco poderá abrir mão dos lucros que vier a registrar sobre os bônus do governo grego, o que deixa o caminho aberto para algum alívio adicional da dívida para a Grécia.
Se a Grécia declarasse inadimplência, os investidores ficariam relutantes em emprestar para outros países europeus pesadamente endividados por medo de que não receberiam seu dinheiro de volta, o que empurraria seus custos de tomada de empréstimos para níveis ainda mais elevados que os atuais. Entre esses países estão a Itália, detentora de uma economia seis vezes maior que a da Grécia. A maioria dos analistas diz que a Itália é grande demais para ser alvo de uma operação de socorro financeiro.
O espectro da inadimplência paira sobre os mercados financeiros mundiais há mais de dois anos. Toda vez que houve avanços - e, de fato, os índices de ações americanas duplicaram em relação aos recordes de baixa alcançados em março de 2009 --, a Grécia sempre foi um empecilho para um progresso maior. E, embora o perigo imediato pareça ter passado, está longe de estar claro se a Grécia obteve alívio à dívida suficiente para reparar suas finanças definitivamente. Sua economia - em última instância o fator fundamental para negociar dívidas - continua em profunda recessão. Ela encolheu à taxa anual de 5% no terceiro trimestre de 2011. Alguns meses antes, estava diminuindo a um ritmo de 8,3%, quase na mesma velocidade de contração registrada pela economia dos Estados Unidos durante a pior fase da Crise de 1929.
Nenhum comentário:
Postar um comentário