Numa ação sem precedentes, a Liga Árabe resolveu ontem impor imediatamente sanções comerciais, financeiras e diplomáticas ao regime sírio por causa da repressão que já matou cerca de 3.500 manifestantes favoráveis à democracia - ao menos mais 8 ontem. Com a medida, apoiada por 19 dos 22 países membros, o organismo diz pretender evitar uma intervenção ocidental na Síria.
As punições incluem o congelamento dos ativos do governo sírio, a suspensão da compra de papéis do Banco Central e de investimentos na Síria e o banimento de viagens de autoridades do regime. Em contrapartida, os países árabes prometeram ajudar a população afetada pelos problemas econômicos, incluindo os refugiados iraquianos, por meio do Crescente Vermelho.
Entre os países que não acompanharam o voto pelas sanções estão o Líbano, que sofre forte influência do vizinho, e o Iraque, preocupado com os refugiados. A Síria, que completa a relação de 22 membros, está suspensa.
O primeiro-ministro do Catar, Hamad bin Jassim Al-Thani, que presidiu a sessão na sede do órgão no Cairo, declarou em entrevista coletiva que as potências estrangeiras poderiam intervir se constatassem que os países árabes não estão atuando de forma "séria" para por fim à crise na Síria. "Todo o trabalho que estamos fazendo é para evitar essa interferência", justificou.
Depois de reunir-se na quarta-feira com líderes da oposição síria, o ministro de Relações Exteriores francês, Alain Juppé, disse ter conversado com autoridades da ONU e com a secretária de Estado americana, Hillary Clinton, sobre a possibilidade de criar "corredores humanitários" para fazer chegar ajuda ao povo sírio. A ideia foi interpretada no mundo árabe como uma tendência em favor da intervenção.
O jornal estatal Al-Thawra (que ironicamente significa "A Revolução", em referência à ascensão do Partido Baath em 1963) condenou em sua primeira página de ontem as sanções, que já haviam sido esboçadas no sábado. Segundo o jornal, elas "não têm precedentes, violam as regras da cooperação árabe" e "têm como alvo o povo sírio".
O secretário-geral da Liga Árabe, o diplomata egípcio Nabil el-Araby, disse que as sanções podem ser suspensas se a Síria cumprir um acordo firmado no dia 2 com a organização, que previa a retirada das tropas dos centros urbanos, a libertação de prisioneiros e a permissão da entrada de observadores no país.
No início da Primavera Árabe, a Liga Árabe, então ainda sob a forte influência de ditadores, sobretudo o egípcio Hosni Mubarak, foi criticada por não apoiar os movimentos pró-democracia. Com a queda de Mubarak, em fevereiro, de Muamar Kadafi, da Líbia, e agora Abdullah Saleh, do Iêmen, a entidade busca sintonia com a chamada "rua árabe". Em março, a suspensão da Líbia da Liga Árabe abriu caminho para a aprovação da zona de exclusão aérea pelo Conselho de Segurança da ONU.
Alcance. Um diplomata com base em Damasco disse ao Estado que resoluções anteriores da Liga Árabe contra a Síria não foram respeitadas. Tunísia, Egito, Omã, Argélia, Sudão, Líbano e Iraque mantiveram seus embaixadores no país, apesar de a entidade ter exigido que eles fossem retirados. Segundo o jornal libanês Daily Star, citando uma autoridade do regime, a estratégia de Damasco é "ter o escudo político de Moscou e a proteção econômica de Bagdá, Teerã e Beirute".
A Jordânia teme que as sanções provoquem uma onda de refugiados para a sua fronteira, enquanto o governo de Bagdá acredita que as medidas econômicas podem afetar os mais de 1 milhão de refugiados iraquianos na Síria que não têm para onde ir. O Hezbollah e o grupo cristão de Michel Aoun, que comandam a coalizão de governo do Líbano, repudiaram as sanções. Há décadas, o regime sírio usa o território libanês para contrabando e transações ilegais.
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário